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16 vezes Jorge Luis Borges sobre o poder dos versos e o ofício do poeta

  • Guilherme Dearo
  • 24 de jun.
  • 3 min de leitura

O escritor e poeta argentino (1899-1986), um dos maiores nomes da literatura mundial, fala sobre o poder da poesia e da sua experiência na literatura em seis conferências proferidas em Harvard entre 1967 e 1968



I. Por que diabos os poetas pelo mundo afora, e pelos tempos afora, haveriam de usar as mesmas metáforas surradas quando há tantas combinações possíveis?


II. Cada palavra é uma metáfora morta.


III. Durante toda a minha vida lhes falei do filósofo chinês Chuan Tzu. Ele sonhou que era uma borboleta e, ao acordar, não sabia se era um homem que sonhara ser uma borboleta ou uma borboleta que agora sonhava ser um homem.


IV. Qualquer coisa sugerida é bem mais eficaz do que qualquer coisa apregoada. Talvez a mente humana tenha uma tendência a negar declarações. (...) quando algo é simplesmente dito ou — melhor ainda — insinuado, há uma espécie de hospitalidade em nossa imaginação. Estamos dispostos a aceitá-lo.


V. Os homens buscaram parentesco com os derrotados troianos, e não com os vitoriosos gregos (...) talvez porque haja uma dignidade na derrota que dificilmente faz parte da vitória.


VI. Os poetas parecem esquecer que, outrora, o narrar uma história era essencial, e o narrar uma história e o declamar o verso não eram pensados como coisas diversas. Um homem narrava uma história; cantava-a; e seus ouvintes não o tomavam como um homem empenhado em duas tarefas, mas antes como um homem empenhado numa tarefa que tinha dois aspectos.


VII. Acho que o romance está em declínio. Acho que todos aqueles experimentos bastante ousados e interessantes com o romance — por exemplo, a ideia de deslocamento temporal, a ideia de a história ser contada por diferentes personagens —, todos eles conduzem ao momento em que o romance não estará mais entre nós.


VIII. Mas existe algo com a história, com a narrativa, que sempre estará presente. Não creio que um dia os homens se cansarão de contar ou ouvir histórias. E se, junto com o prazer de nos ser contada uma história, tivermos o prazer adicional da dignidade do verso, então algo grandioso terá acontecido.


IX. Creio que o poeta haverá de ser outra vez um fazedor. Quero dizer, contará uma história e também a cantará. E não consideraremos diversas essas duas coisas, tal como não pensamos que são diversas em Homero ou em Virgílio.


X. Suponho que haja tantos credos, tantas religiões, quantos são os poetas.


XI. Como sabem, eu me aventurei na escrita; mas acho que o que li é muito mais importante que o que escrevi. Pois a pessoa lê o que gosta — porém não escreve o que gostaria de escrever, e sim o que é capaz de escrever.


XII. Eu pensava que a linguagem fosse um modo de dizer as coisas, de externar queixas, de dizer que se estava feliz ou triste etc. Mas quando escutei aqueles versos (e os continuo escutando, em certo sentido, desde então), soube que a linguagem podia também ser música e paixão. E assim me foi revelada a poesia.


XIII. (...) a ideia de que, embora a vida de uma pessoa seja composta de milhares e milhares de momentos e dias, esses muitos instantes e esses muitos dias podem ser reduzidos a um único: o momento em que a pessoa sabe quem é, quando se vê diante de si.


XIV. A princípio, certamente, eu era apenas um leitor. Porém acho que a felicidade de um leitor está além da de um escritor, pois o leitor não precisa experimentar aflição nem ansiedade: seu negócio é simplesmente a felicidade. E a felicidade, quando se é leitor, é frequente.


XV. Vejo-me como um escritor. O que significa ser um escritor para mim? Significa simplesmente ser fiel a minha imaginação. Quando escrevo algo, não o tomo como factualmente verdadeiro (o simples fato é uma trama de circunstâncias e acidentes), mas como fiel a outro algo mais profundo. Quando escrevo uma história, escrevo-a porque de alguma forma acredito nela — não como se acredita na simples história, mas antes como se acredita num sonho ou numa ideia.


XVI. Não acho que a inteligência tenha muito a ver com o trabalho de um escritor. Acho que um dos pecados da literatura moderna é ser muito autoconsciente.


Jorge Luis Borges. Esse Ofício do Verso. Companhia das Letras, 2019. Trad. José Marcos Macedo.

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